A escravidão foi um dos fatos históricos dos quais a humanidade pode e deve sentir-se envergonhada. Contudo, mesmo algo assim pode gerar frutos positivos. Foi o que aconteceu na Jamaica, com o surgimento do movimento rastafári e do reggae.
Os colonizadores proibiam os escravos de professarem suas religiões africanas e, ao mesmo tempo, consideravam o cristianismo uma religião para povos brancos e desenvolvidos. Além do mais, certas noções de igualdade pregadas pela religião cristã não eram nada convenientes aos senhores de escravos. A África, como um todo, era considerada um local inferior, povoado por seres não civilizados. Daí, a necessidade do envio de missionários, para levar a civilização e a salvação àqueles povos.
Os negros escravizados sentiam-se oprimidos e tentavam manter suas crenças, de forma clandestina. Os Maroons, escravos fugidos que foram viver nas montanhas, em comunidades semelhantes aos quilombos brasileiros, foram responsáveis em grande parte pela resistência à cultura dos colonizadores.
Embora a escravatura tenha terminado em 1833, o movimento rastafári surgiria apenas um século depois, em 1930, a partir das ideias de Marcus Garvey, um ativista negro, descendente dos Maroons. Ele pregava a união dos povos negros e seu retorno à África. Seus conceitos encontraram grande aceitação junto a líderes religiosos da Jamaica, que passaram a considerar Garvey um profeta. Uma frase sua, vista como profecia, deu origem ao rastafarianismo. Garvey disse: “Olhe para a África, onde um rei negro será coroado. Ele será nosso redentor.”
O rei coroado foi Haile Selassie I, imperador da Etiópia, nascido Tafari Makonnen e posteriormente conhecido como Rás Tafari. Para os seguidores de Marcus Garvey, a profecia havia se concretizado e Haile Selassie passou a ser declarado o Messias Negro, Jah Rastafári, aquele que iria reuni-los na África.
Acredita-se que o primeiro grupo de rastafáris tenha se estabelecido na Jamaica, em 1935, liderados por Leonard P. Howell. Ele pregava a divindade de Selassie e explicava que os negros ganhariam a superioridade sobre os brancos, superioridade essa que sempre lhes fora destinada. Era o início do movimento, que buscava a repatriação para a África e a libertação dos povos negros.
Em 1954, a comunidade liderada por Howell foi destruída por uma batida policial e seus seguidores espalharam-se por toda a ilha, difundindo os conceitos do movimento. Em 1966, Haile Selassie visitou a Jamaica e foi recebido com grande entusiasmo. Bob Marley, que havia passado um tempo nos EUA, retornou para a ilha e converteu-se formalmente ao rastafarianismo. Nos anos 1960, graças a Marley e outros artistas ligados ao reggae, o movimento rastafári ganhou maiores proporções e passou a ser conhecido também fora da Jamaica.
Em 1974, Haile Salassie foi deposto por uma revolução marxista e, no ano seguinte, morreu de forma misteriosa. O governo etíope anunciou a morte, mas não havia corpo. Se, por um lado, a morte de Selassie abalou as convicções dos rastas, por outro fez aumentar ainda mais sua fé. Poucos dias após o anúncio da morte, Bob Marley lançou a canção Jah Live (ouça abaixo), defendendo os princípios do movimento, apesar da aparente perda. Há quem acredite que Selassie não morreu e assumiu outra identidade. Para outros, ele de fato morreu, mas, assim como Cristo, um dia voltará para salvar seu povo.