Basicamente, vejo duas possibilidades para a formação de supergrupos musicais – aqueles em que pelo menos um ou dois integrantes são oriundos de outras bandas de sucesso ou já possuem uma sólida carreira solo. A primeira é que a vida de popstar é meio enfadonha e, de repente, o cara acorda agoniado, com vontade de fazer algo diferente. Daí, liga para uns amigos igualmente famosos e entediados e pronto.
A segunda é que o artista tem múltiplas facetas que nem sempre podem ser exploradas em seu status atual como membro de uma banda ou em sua própria carreira solo. Então, surge a ideia de um novo projeto. Ele entra em contato com outros músicos que conheceu ao longo da carreira e eles topam a empreitada. Além de mais glamourosa e de, certamente, render boas respostas nas coletivas de imprensa, é o que acontece muitas vezes.
Essas reuniões de feras geram resultados bem interessantes. Aqui no Brasil, o caso mais famoso e o único de que me lembro é o dos Tribalistas – Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte. Marisa foi gravar uma participação no disco de Arnaldo, que estava sendo produzido por Brown. Conversa vai, conversa vem, em pouco tempo já tinham canções suficientes para um disco.
Tudo isso aconteceu em 2002, o álbum vendeu mais de 1,5 milhão de cópias só no Brasil e os três nunca fizeram uma grande turnê. Apesar do enorme sucesso de músicas como Já Sei Namorar e a linda Velha Infância, cada um dos três continuou sua própria carreira, em sua própria tribo.
Mundo afora a lista de supergrupos é enorme, desde os mais antigos como Cream, de Eric Clapton, passando por Emerson, Lake and Palmer, Temple of the Dog e Foo Fighters – este último, inclusive, mais duradouro do que os grupos de origem, como o Nirvana.
Em 2011 surgiu o SuperHeavy, formado por Mick Jagger, Joss Stone, Dave Stewart (Eurithmics), A. R. Rahman (produtor de trilhas sonoras) e Damian Marley. Analisando em partes dá para encontrar se não similaridades, pelo menos intersecções entre seus trabalhos. Mick Jagger é puro rock, mas também blues e pop. Joss Stone faz mais a linha soul e R&B, mas também é blues e jazz. Dave Stewart é pop rock, Rahman é um músico indiano e Damian Marley é reggae, claro!
A história é mais ou menos assim: Dave Stewart comprou uma casa na Jamaica. Ouvia muita música vinda das ruas e ficou inspirado para começar algo novo. Queria misturar estilos, pensou em juntar orquestração indiana que ele e Jagger já curtiam.
Mick Jagger, por sua vez, já flertava com o reggae desde os anos 1960, quando dançava nos clubes jamaicanos, em Londres. Lá, ele conheceu Bob Marley quando este gravava “Catch A Fire”, com The Wailers – seu primeiro disco pela Island Records, de Chris Blackwell. Finalmente, em 1978, Jagger e Peter Tosh fizeram um dueto na versão reggae da canção Don’t Look Back, dos The Temptations (assista abaixo).
Em 2004, no remake do filme “Alfie”, com Jude Law no papel principal, Jagger e Stewart produziram a trilha sonora e participaram de várias canções. Uma delas, Old Habits Die Hard, foi a vencedora do Globo de Ouro 2005, na categoria de melhor canção original. Joss Stone também participou em duas faixas dessa trilha.
Anos depois, em 2009, Joss Stone, dona de uma bela voz feminina, participou do disco “Y Not”, do beatle Ringo Starr. Dave Stewart também trabalhou nesse disco e talvez aí tenha surgido mais uma conexão. Em 2011, Stewart foi o produtor do quinto álbum de Joss, “LP1”.
Muito incentivada por Damian Marley, seu companheiro de SuperHeavy, Joss Stone lançou, no último mês de julho, um álbum de reggae chamado “Water For Your Soul”. Damian participou como co-produtor e também em alguns vocais e letras. Ouça acima playlist especial com algumas das principais faixas do disco.
A. R. Rahman, cuja carreira na Índia já era um sucesso, levou nada menos que dois Oscar em 2009, pela melhor trilha sonora original e melhor canção original do filme “Quem Quer Ser um Milionário?”. Por fim, Damian veio para representar a Jamaica e arrematar esse quebra-cabeça musical.
Feitas as análises e voltando ao SuperHeavy, foram dois anos de trabalho secreto, até o lançamento do álbum de mesmo nome do grupo, em 2011. Eles se reuniam em Los Angeles com o objetivo de “escrever canções que tivessem significado”. Miracle Worker foi a primeira faixa lançada como single e também num clipe no YouTube.
Não houve consenso nem de crítica, nem de público. Apesar do álbum ter ficado entre os 30 primeiros no Billboard 200, faltou divulgação e as vendas foram fracas: apenas 33.000 cópias no lançamento. Gostoso de ouvir e com músicas bem elaboradas, o álbum não decolou. Talvez, dizem alguns, tenha se perdido na vontade de ser tudo para todos. Talvez, penso eu, tenha sido um projeto de músicos para músicos: foi prazeroso e divertido fazer. Não fez sucesso? Paciência, vamos em frente.